Quando a Qualidade e Segurança encontra a Experiência do Paciente

4 de junho de 2021

Perguntar ao paciente: “o que importa para você?” foi além de iniciar conversas transformadoras. Neste relato rompeu fronteiras e melhorou significativamente o cuidado não só de uma pessoa, mas de muitos outros pacientes com indicação de restrição ao leito. Sem dúvida, um exemplo de quando a Qualidade e Segurança encontra a Experiência do Paciente

Em meados de 2016 recebi um convite para participar da 1° turma do curso de Especialista em Melhoria pelo IHI – Institute for Healthcare Improvement em parceria com o Hospital Israelita Albert Einstein. Estava muito feliz e grata com o convite, precisava agora escolher um tema para que pudesse aplicar meu aprendizado, algo que fosse importante e útil para a organização.

Recentemente havíamos passado pela reacreditação da Joint Commission International e escolhi um dos pontos que eles haviam apontado como uma oportunidade de melhoria, a restrição do paciente no leito. A restrição é um procedimento médico e da equipe multiassistencial, na qual um paciente tem uma indicação para que fique retido ao leito, principalmente para não sacar acessos ou outros equipamentos ligados a ele. O que sem dúvidas, impacta na experiência do paciente.

A experiência na prática

Então, num dia pela manhã fui até a UTI-Adulto observar este processo, conversar com a equipe assistencial e verificar quais mudanças seriam possíveis propor para melhorar este processo.

Resolvi conversar com um paciente, escolhi uma moça que deveria estar entre seus 17-19 anos, na verdade conversei com a mãe que a acompanhava, enquanto a moça dormia. Meu objetivo era entender quais as melhorias que ela enxergava como familiar.

Certamente, a mãe era bem esclarecida e conhecia as indicações da restrição para sua filha. Ela sabia, portanto que pela segurança da paciente era claro a manutenção e a necessidade de tal procedimento.

Os materiais que estavam sendo usados estavam corretos, bem como a indicação médica, naquele momento não vi grandes oportunidades para melhorar aquele processo. Porém, no final da conversa com a acompanhante ela me disse: “Olha, uma das coisas que importam para mim é manter a comunicação com minha filha, ela é autista, não fala e a sua comunicação comigo é pelas mãos. Faz cinco dias que ela não pode pegar nas minhas mãos, por conta da restrição ao leito...”.

"Olha, uma das coisas que importam para mim é manter a comunicação com minha filha, ela é autista, não fala e a sua comunicação comigo é pelas mãos."

Aquilo foi como uma luz que se acendeu para mim. Eu ainda não sabia o que iria fazer para mudar aquela situação, mas sentia que algo precisava ser feito. Levei o caso para meu grupo de trabalho, um grupo multiprofissional e propusemos testar algo diferente. Era preciso chegar a algo que deixasse os pacientes sem os membros superiores presos ao leito, mas com um imobilizador de cotovelo.

Nós fizemos testes com os materiais que tínhamos. Contamos com a ajuda das terapeutas ocupacionais e costureiras. Além disso, produzimos um protótipo para ser realizado um teste com pacientes também com indicação de restrição ao leito. Após inúmeros ajustes,  resultado dos relatos dos pacientes que testaram este protótipo chegamos em uma versão final. Uma que atendia os critérios de segurança do paciente e normas de controle de infecção.

Conseguimos a produção por uma indústria de materiais médico-hospitalares e aprovar a venda deste imobilizador de cotovelos para toda a sociedade. Hoje este produto está disponível para todos.

Dessa forma, conseguimos melhorar nossos indicadores de restrição na UTI. Isto é, temos menos pacientes restritos, a jornada do paciente e da família ficou mais leve. E, principalmente, provamos que a Qualidade e Segurança está intimamente ligada à Experiência do Paciente.

Tenho muito orgulho deste projeto que tive a honra de desenvolver no Hospital Israelita Albert Einstein e muito feliz em proporcionar a melhora da Experiência do Paciente não só aqui, mas para toda a sociedade.

Lembrem-se sempre em trazer os pacientes para os projetos de melhoria da organização. Esse é uma escolha única, pois a visão do paciente é única e só ele pode trazer.

Carla Behr Pitoli

Gerente Escritório Planetree Brasil

Especialista em Melhoria - IHI

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